terça-feira, 28 de junho de 2011

Leitura dos Clássicos em sala de aula desde cedo

          
          Ao ser lido desde cedo, os clássicos são absorvidos de uma maneira muito especial porque  as crianças comunicam o ato de ler como a qualquer outra experiência um sabor e uma importância particulares. E este é o papel da escola: possibilitar o acesso à ficção Fe qualidade de forma prazerosa.
“ler os clássicos desperta o gosto pela viagem, pela imersão no desconhecido e pela exploração. da diversidade. A satisfação de se deixar transportar para outro tempo e outro espaço, de viver uma vida com experiências diferentes do cotidiano”, ressalta a escritora Ana Maria Machado.

 exemplo de leitura

          O grande desafio é saber como trabalhar esse material em classe. O importante é seduzir o leitor e colocá-lo como parte da historia. Porém o mais importante é o professor contar  a relação que tem com a obra, ler trechos dos quais possa falar com paixão e entusiasmo, mostrar os encantos (literários ou não) que chamaram sua atenção, as conversas com amigos que ela rendeu e quanto ele se identificou e descobriu sobre si mesmo em cada passagem.
Nos anos iniciais, o ideal é começar a trabalhar Machado pelos contos, compreensível por leitores de qualquer idade e com uma historia bem próxima da realidade infantil.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

A Cartomante - Em quadrinhos


A Cartomante em quadrinhos é uma boa dica para os mais jovens!!!

A cartomante, escrito por Machado de Assis, é um dos títulos que integram a coleção Literatura Brasileira em Quadrinhos. Nesse, que é um dos mais bem construídos contos de Machado, o leitor acompanha o triângulo amoroso envolvendo Vilela, sua esposa Rita e o amigo Camilo. Trata-se de uma obra-prima com um desfecho trágico e surpreendente.

A coleção Literatura Brasileira em Quadrinhos traz grandes obras de autores nacionais consagrados transpostas para a linguagem ágil e versátil dos quadrinhos. Cada volume traz o texto original e sem adaptações. Indicado para jovens a partir dos 12 anos. Vem com um suplemento de atividades.

Memorial de Aires


Memorial de Aires, uma quase biografia machadiana

O Conselheiro Aires, diplomata aposentado, escreveu seu memorial, falando das suas relações mais próximas, que são o casal Aguiar, a irmã Rita, o Desembargador Campos e sua sobrinha viúva [Fidélia].

O Conselheiro Aires, homem marcadamente polido e estóico [rígido], dá claras evidências de sua paixão por Fidélia, mas nunca tem coragem de revelar-se, pois acha-se então com sessenta e dois anos e ela, uma mulher jovem. O conselheiro, faz questão de extremar nos detalhes e conta de seu relacionamento com o casal Aguiar.

O casal Aguiar não teve filhos, mas têm em Fidélia, uma jovem viúva e em Tristão, um afilhado, verdadeiros filhos, ou seja, há uma consideração evidente para com eles por parte do casal. Com a volta do rapaz, a afeição vê - se reanimada.

Fidélia, viúva há aproximadamente dois anos, recolhera - se em seu mundo, afastada do convívio social, junto a seu tio, o desembargador Campos. Seu casamento contrariara o pai - Barão de Santa Pia - que era inimigo político do pai de Noronha [seu marido]. Dessa forma, a jovem, com a morte do marido, acabara por ficar junto ao tio, no Rio de Janeiro, não tendo condições de voltar ao convívio paterno, na fazenda, pois as relações continuavam estremecidas.

Ninguém julgava que Fidélia pudesse voltar a se casar, porem Tristão, aos poucos, conquista - a, trazendo - a de volta aos seus entretenimentos: a música e a pintura.

O romance agrada ao casal Aguiar, que apoiam o casamento, um tanto esperançoso de que os jovens continuariam com eles. Casados, e depois da lua de mel em Petrópolis, Fidélia e Tristão acabam voltando para a Europa, pois, em Portugal, o rapaz candidatara-se a deputado.

Novamente, o velho casal Aguiar encontra-se sozinho, amargando a saudade dos filhos postiços.

A narrativa do Memorial abrange os anos de 1888 e 1889. Machado de Assis, mestiço e discretamente abolicionista, registra com simpatia, sempre através das palavras atenuadas de Aires, o momento em que a Abolição da Escravatura é concretizada.

Contrariando aqueles que acusam Machado de Assis de nunca ter se envolvido com a questão escravista, as palavras de Aires em relação à Abolição fogem ao seu estilo sempre tão comedido e diplomático. Revelam, portanto, o autor atrás do narrador. Através de Aires, Machado de Assis deixa seu testemunho sobre a escravidão. As declarações convictas do conselheiro não deixam dúvidas quanto a seu envolvimento emocional com a questão.

domingo, 26 de junho de 2011

Teria sido Capitu culpada de adultério?


Dom Casmurro

          Dom Casmurro Bentinho, chamado de Dom Casmurro por um rapaz deseu bairro, decide atar as duas pontas de sua vida . A partir daí, inicia acontar sua história (importante salientar esse detalhe !!!! É Bentinho que nos narra sua vida).Morando em Matacavalos com sua mãe Dona. Glória,viúva , José Dias o agregado, Tio Cosme advogado e viúvo e prima Justina (viúva) , Bentinho possuía uma vizinha que conviveu como"irmã-namorada" dele , Capitolina - a Capitu . Seu projeto de vida era claro, sua mãe havia feito uma promessa, em que Bentinho iria para um seminário e tornar-se-ia um padre . Cumprindo a promessa Bentinho vai para o seminário, mas sempre desejando sair, pois se tornando padre não poderia casarcom Capitu . José Dias, que sempre foi contra ao namoro dos dois, é quemconsegue retirar Bentinho do seminário, convencendo Dona Glória que o jovem deveriair estudar no exterior, José Dias era fascinado por direito e pelos estudos noexterior. Quando retorna do exterior, Bentinho consegue casar com Capitu edesde os tempos de seminário havia fundamentado amizade com Escobar que agoraestava casado e sempre foi o amigo íntimo do casal.
          Nasce o filho de Capitu, Ezequiel. Escobar, o amigo íntimo, falece e durante o seu velório Bentinho percebeque Capitu não chorava, mas aguçava um sentimento fortíssimo. A partir dessemomento começa o drama de Bentinho. Ele percebe que o seu filho (?) era a carade Escobar e ele já havia encontrado, às vezes, Capitu e Escobar sozinhos emsua casa. Embora confiasse no amigo, que era casado e tinha até filha, odesespero de Bentinho é imenso. Vão para Europa e Bentinho depois de um tempovolta para o Brasil . Capitu escreve-lhe cartas, a essa altura, a mãe deBentinho já havia morrido, assim como José Dias. Ezequiel um dia vem visitar opai e conta da morte da mãe. Pouco tempo depois, Ezequiel também morre, mas aúnica coisa que não morre no romance é Bentinho e sua dúvida .Análise num pequeno comentário :Os olhos oblíquos e dissimulados de Capitudemonstram as duas pontas da história da vida de Bentinho: seu primeiro beijona amada ocorre mediante a percepção daqueles belíssimos olhos de ressaca e seudrama é, justamente, a percepção no velório dos mesmos olhos de Capitu. Ainfância coligada com Capitu também contribui para a afirmação de Bentinho,pois ela sempre esteve com o espírito de dissimulação que o deixava abismadonos momentos que ela conseguia enganar o próprio pai , o velho Pádua.
          Dom Casmurro é um livro complexo e cada leituraorigina uma nova interpretação. Segundo Fábio Lucas, prefacionista de uma dasedições de Dom Casmurro: "É a triangulação ideal que traduz a certeza deuma consciência conturbada , a de Bentinho (cujo nome - Bento Santiago - Santorepresenta Bem e Iago no drama Othello é a consciência perversa, ou seja, afusão entra o bem e o mal), e resulta, para o destinatário de seu discursomesclado de objetividade e de ressentimento (subjetivismo), numa ambigüidadeinsolúvel".Machadode Assis faz em Dom Casmurro um fato inacreditável em sua narrativa: Ele cria umnarrador que afirma algo (ou seja, diz que foi traído) e o leitor não conseguedecidir-se se ele está mentindo ou não.. E aquela famosa pergunta que é a trilogia doromance, não só entre os brasileiros, mas também como os estudiosos do livro deoutros países: Teria sido Capitu culpada de adultério?

Machado de Assis - Um Mestre na Periferia

Machado de Assis - um mestre na periferia
Documentário da série Mestres da Literatura da TV Escola. Via Domínio Público.


   A TV Escola é unanimidade quando se trata de programas educativos. Mas nem todo mundo tem uma  antena Parabólica  em casa, ou pode assinar a TV Digital.

Sinopse
    A vida do escritor e as duas fases de sua obra. Os caminhos de sua profissionalização até o ingresso na Academia Brasileira de Letras. A visão política de Machado de Assis sobre as transformações da sociedade brasileira.

Comentários e Opiniões 
Roberto Schwarz - Ensaísta, crítico literário, Professor aposentado de Teoria Literária Brasileira - USP e UNICAMP.
Sidney Chalhoub - Prof. de História - UNICAMP.
Alfredo Bosi - Prof. de Literatura - USP.
José Miguel Wisnik - Músico e Prof. Literatura - USP.

Ficha Técnica
Direção e roteiro: Daniel Augusto
Produção executiva: Malu Viana Batista
Realização: Pólo Imagem e TV PUC para a TV ESCOLA/MEC, 2006
Duração: 24’43"


Fragmento do ensaio "Sentimento de Nacionalidade"
"O que se deve exigir de um escritor antes de tudo é certo sentimento íntimo que o torne homem do seu tempo e do seu país, ainda quando trate de assuntos remotos no tempo e no espaço."
Machado de Assis

sábado, 25 de junho de 2011

Biografia - Machado de Assis

 No dia 21 de junho comemorou-se o 171º aniversário de Machado de Assis 

   Joaquim Maria Machado de Assis nasceu dia 21 de junho de 1839, na cidade do Rio de Janeiro. O garoto pobre, filho de um operário mestiço chamado Francisco José de Assis e de Maria Leopoldina Machado de Assis, marcou a história da literatura brasileira. Ao contrário do que se imagina, a trajetória de Machado de Assis não o conduziu naturalmente para o mundo das letras. Ainda na infância o jovem “Machadinho”, como era carinhosamente chamado, perdeu sua mãe.

    Durante sua infância e adolescência foi criado por Maria Inês, sua madrasta. A falta de recursos financeiros o obrigou a dividir seu tempo entre os estudos e o trabalho de vendedor de doces. Ainda sobre condições não muito favoráveis, Machado de Assis demonstrava possuir grande facilidade de aprendizado. Segundo alguns relatos – no tempo em que morou em São Cristóvão – aprendeu a falar francês com a dona de uma padaria da região.

    Já aos 16 anos conseguiu publicar sua primeira obra literária na revista “Marmota Fluminense”, onde registrou as linhas do poema “Ela”. No ano seguinte, Machado conseguiu um cargo como tipógrafo na Imprensa Nacional e dividiu seu tempo com a criação de novos textos. Durante sua estadia na Imprensa Nacional, o escritor iniciante teve a oportunidade de conhecer Manuel Antônio de Almeida, diretor da instituição e autor do romance “Memórias de um sargento de milícias”.

O contato com o diretor lhe concedeu novas oportunidades no campo da literatura e o alcance de outros postos de trabalho. Aos 19 anos de idade, Machado de Assis se tornou colaborador e revisor do Jornal Marmota Fluminense. Nesse período conheceu outros expressivos escritores de seu tempo, como José de Alencar, Gonçalves Dias, Manoel de Macedo e Manoel Antônio de Almeida. Nesse tempo ainda se dedicou à escrita de obras românticas e ao trabalho jornalístico.

    Entre 1859 e 1860, conseguiu emprego como colaborador e revisor de diferentes meios de comunicação da época. Entre outros jornais e revistas, Machado de Assis escreveu para o Correio Mercantil, Diário do Rio de Janeiro, O Espelho, A Semana Ilustrada e Jornal das Famílias. A primeira obra impressa de Machado de Assis foi o livro “Queda que as mulheres têm para os tolos”, onde aparece como tradutor. Na década de 1860, consolidou sua carreira profissional como revisor e editor.

Na mesma época conheceu Faustino Xavier de Novais, diretor da revista “O futuro” e irmão de sua futura esposa. Seu casamento com Carolina foi bem sucedido e marcado pela afinidade que sua companheira também possuía com o mundo da literatura. Em 1867, Machado de Assis publicou seu primeiro livro de poesias, intitulado “Crisálidas”. O sucesso da carreira literária teve seqüência com a publicação do romance “Ressurreição”, de 1872.

    A vida de intelectual foi amparada por uma promissora carreira constituída no funcionalismo público. A conquista do cargo de primeiro oficial da Secretaria de Estado do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas ofereceu uma razoável condição de vida. No ano de 1874, produziu o romance “A mão e a luva” em uma seqüência de publicações realizadas dentro do jornal O Globo, na época, mantido por Quintino Bocaiúva.

    O prestígio artístico de Machado de Assis o tornou um autor de grande popularidade. Durante as comemorações do tricentenário de Luís de Camões, produziu uma peça de teatro encenada no Imperial Teatro Dom Pedro II. Entre 1881 e 1897, o jornal Gazeta de Notícias abrigou grande parte daquelas que seriam consideradas suas melhores crônicas.
O ano de 1881 foi marcante para a carreira artística e burocrática de Machado de Assis. Naquele mesmo ano, Machado tornou-se oficial de gabinete do ministério em que trabalhava e publicou o romance “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, considerado de suma importância para o realismo na literatura brasileira.

    A ampla rede de relações e amizades de Machado de Assis lhe abriu portas para um outro importante passo na história da literatura brasileira. Em reuniões com seu amigo, e também escritor, José Veríssimo confabulou as primeiras medidas para a criação da Academia Brasileira de Letras. Participando ativamente das reuniões de escritores que apoiavam tal projeto, Machado de Assis tornou-se o primeiro presidente da instituição. Com a sua morte, em 1908, foi sucedido por Rui Barbosa.

    A trajetória de Machado de Assis é alvo de interesse dos apreciadores da literatura e de vários pesquisadores. A sua obra conta com um leque temático e estilístico bastante variado, dificultando bastante o enquadramento de seu legado em um único gênero. O impacto da sua obra chegou a figurá-lo entre os principais nomes da literatura internacional.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Plano de aula escolar baseado no texto "Um Apólogo" de Machado de Assis


Projeto: Um Apólogo

Objetivo: Ampliação da capacidade de análise literária.
Conteúdos: Leitura e compreensão de texto Um Apólogo, de Machado de Assis.
Anos: 4º e 5º.
Tempo Estimado: 12 aulas.
Material necessário:
·         Cópias de Um Apólogo para todos;
·         Livros e sites de historia sobre o Rio de Janeiro do século 19;
·         Caixa de costura com agulha, linha e alfinete e um pedaço de tecido.
Desenvolvimento:
1.       Etapa
Peça que os alunos citem escritores. Se Machado não for lembrado, diga que ele é o principal escritor brasileiro e que será estudado.
2.       Etapa
Reúna revistas, filmes, imagens e objetos representativos do século 19 e obras de Machado, criando um ambiente literário. Divida a classe em grupos,que pesquisarão : o Brasil do século 19 , gravuras do Rio de Janeiro, biografia do escritor e relação de obras. O material comporá um painel.
3.       Etapa
Apresente o texto Um Apólogo e esclareça que apólogo é uma narrativa curta e, como fábula, tem um uma moral. Deixe a caixa de costura à vista. Pergunte às crianças se elas sabem quem serão os personagens da historia. Dobre o tecido, prenda-o com o alfinete, enfie a linha na agulha e costure. Questione a função da agulha, da linha e do alfinete.
Pergunte quem cada um preferiria ser- a agulha ou a linha – e por quê.
4.        Etapa
Faça a leitura coletiva, ajudando os alunos a descobrir (pelo contexto) o significado de termos desconhecidos sem usar o dicionário. Peça que observem  os argumentos da linha e da agulha e como cada um deles, apesar de válido, logo é derrubado.
5.       Etapa
Inicie a análise do texto. Auxilie a turma a perceber os elementos da narrativa. Quem são os personagens?
Em que lugar a história se passa?
No texto, quem é mais importante no trabalho de costura: a agulha ou a linha? Por quê? As respostas devem ser justificadas com trechos do texto.
6.       Etapa
O alfinete é o porto-voz da moral da história. Discuta sobre ela com os estudantes: existem pessoas que ajudam outras, abrindo caminhos. Mas, conquistada uma vitória, que foi ajudada. Pergunte o que eles pensam sobre isso. Trabalhe os conceitos de arrogância e o de humilhação, citando a arrogância da agulha e depois a humilhação pela qual teve de passar.

Avaliação:
Para avaliar a compreensão e a visão critica do texto, peça que a turma faça a leitura dramatizada dele e que cada aluno escrava um apólogo.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Realismo x Naturalismo

Entenda os conceitos de Realismo e Naturalismo. Realismo, escola literária na qual se destacava Machado de Assis.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Conto de Escola - Parte 04

- Precisamos muito cuidado, disse eu ao Raimundo.

- Diga-me isto só, murmurou ele.

Fiz-lhe sinal que se calasse; mas ele instava, e a moeda, cá no bolso, lembrava-me o contrato feito. Ensinei-lhe o que era, disfarçando muito; depois, tornei a olhar para o Curvelo, que me pareceu ainda mais inquieto, e o riso, dantes mau, estava agora pior. Não é preciso dizer que também eu ficara em brasas, ansioso que a aula acabasse; mas nem o relógio andava como das outras vezes, nem o mestre fazia caso da escola; este lia os jornais, artigo por artigo, pontuando-os com exclamações, com gestos de ombros, com uma ou duas pancadinhas na mesa. E lá fora, no céu azul, por cima do morro, o mesmo eterno papagaio, guinando a um lado e outro, como se me chamasse a ir ter com ele. Imaginei-me ali, com os livros e a pedra embaixo da mangueira, e a pratinha no bolso das calças, que eu não daria a ninguém, nem que me serrassem; guardá-la-ia em casa, dizendo a mamãe que a tinha achado na rua. Para que me não fugisse, ia-a apalpando, roçando-lhe os dedos pelo cunho, quase lendo pelo tato a inscrição, com uma grande vontade de espiá-la.

- Oh! seu Pilar! bradou o mestre com voz de trovão.

Estremeci como se acordasse de um sonho, e levantei-me às pressas. Dei com o mestre, olhando para mim, cara fechada, jornais dispersos, e ao pé da mesa, em pé, o Curvelo. Pareceu-me adivinhar tudo.

- Venha cá! bradou o mestre.

Fui e parei diante dele. Ele enterrou-me pela consciência dentro um par de olhos pontudos; depois chamou o filho. Toda a escola tinha parado; ninguém mais lia, ninguém fazia um só movimento. Eu, conquanto não tirasse os olhos do mestre, sentia no ar a curiosidade e o pavor de todos.

- Então o senhor recebe dinheiro para ensinar as lições aos outros? disse-me o Policarpo.

- Eu...

- Dê cá a moeda que este seu colega lhe deu! clamou.

Não obedeci logo, mas não pude negar nada. Continuei a tremer muito. Policarpo bradou de novo que lhe desse a moeda, e eu não resisti mais, meti a mão no bolso, vagarosamente, saquei-a e entreguei-lha. Ele examinou-a de um e outro lado, bufando de raiva; depois estendeu o braço e atirou-a à rua. E então disse-nos uma porção de coisas duras, que tanto o filho como eu acabávamos de praticar uma ação feia, indigna, baixa, uma vilania, e para emenda e exemplo íamos ser castigados. Aqui pegou da palmatória.

- Perdão, seu mestre... solucei eu.

- Não há perdão! Dê cá a mão! Dê cá! Vamos! Sem-vergonha! Dê cá a mão!

- Mas, seu mestre...

- Olhe que é pior!

Estendi-lhe a mão direita, depois a esquerda, e fui recebendo os bolos uns por cima dos outros, até completar doze, que me deixaram as palmas vermelhas e inchadas. Chegou a vez do filho, e foi a mesma coisa; não lhe poupou nada, dois, quatro, oito, doze bolos. Acabou, pregou-nos outro sermão. Chamou-nos sem-vergonhas, desaforados, e jurou que se repetíssemos o negócio apanharíamos tal castigo que nos havia de lembrar para todo o sempre. E exclamava: Porcalhões! tratantes! faltos de brio!

Eu, por mim, tinha a cara no chão. Não ousava fitar ninguém, sentia todos os olhos em nós. Recolhi-me ao banco, soluçando, fustigado pelos impropérios do mestre. Na sala arquejava o terror; posso dizer que naquele dia ninguém faria igual negócio. Creio que o próprio Curvelo enfiara de medo. Não olhei logo para ele, cá dentro de mim jurava quebrar-lhe a cara, na rua, logo que saíssemos, tão certo como três e dois serem cinco.

Daí a algum tempo olhei para ele; ele também olhava para mim, mas desviou a cara, e penso que empalideceu. Compôs-se e entrou a ler em voz alta; estava com medo. Começou a variar de atitude, agitando-se à toa, coçando os joelhos, o nariz. Pode ser até que se arrependesse de nos ter denunciado; e na verdade, por que denunciar-nos? Em que é que lhe tirávamos alguma coisa?

- Tu me pagas! tão duro como osso! dizia eu comigo.

Veio a hora de sair, e saímos; ele foi adiante, apressado, e eu não queria brigar ali mesmo, na Rua do Costa, perto do colégio; havia de ser na Rua larga São Joaquim. Quando, porém, cheguei à esquina, já o não vi; provavelmente escondera-se em algum corredor ou loja; entrei numa botica, espiei em outras casas, perguntei por ele a algumas pessoas, ninguém me deu notícia. De tarde faltou à escola.

Em casa não contei nada, é claro; mas para explicar as mãos inchadas, menti a minha mãe, disse-lhe que não tinha sabido a lição. Dormi nessa noite, mandando ao diabo os dois meninos, tanto o da denúncia como o da moeda. E sonhei com a moeda; sonhei que, ao tornar à escola, no dia seguinte, dera com ela na rua, e a apanhara, sem medo nem escrúpulos...

De manhã, acordei cedo. A idéia de ir procurar a moeda fez-me vestir depressa. O dia estava esplêndido, um dia de maio, sol magnífico, ar brando, sem contar as calças novas que minha mãe me deu, por sinal que eram amarelas. Tudo isso, e a pratinha... Saí de casa, como se fosse trepar ao trono de Jerusalém. Piquei o passo para que ninguém chegasse antes de mim à escola; ainda assim não andei tão depressa que amarrotasse as calças. Não, que elas eram bonitas! Mirava-as, fugia aos encontros, ao lixo da rua...

Na rua encontrei uma companhia do batalhão de fuzileiros, tambor à frente, rufando. Não podia ouvir isto quieto. Os soldados vinham batendo o pé rápido, igual, direita, esquerda, ao som do rufo; vinham, passaram por mim, e foram andando. Eu senti uma comichão nos pés, e tive ímpeto de ir atrás deles. Já lhes disse: o dia estava lindo, e depois o tambor... Olhei para um e outro lado; afinal, não sei como foi, entrei a marchar também ao som do rufo, creio que cantarolando alguma coisa: Rato na casaca... Não fui à escola, acompanhei os fuzileiros, depois enfiei pela Saúde, e acabei a manhã na Praia da Gamboa. Voltei para casa com as calças enxovalhadas, sem pratinha no bolso nem ressentimento na alma. E contudo a pratinha era bonita e foram eles, Raimundo e Curvelo, que me deram o primeiro conhecimento, um da corrupção, outro da delação; mas o diabo do tambor...

Conto de Escola - Parte 03

Minha resposta foi estender-lhe a mão disfarçadamente, depois de olhar para a mesa do mestre. Raimundo recuou a mão dele e deu à boca um gesto amarelo, que queria sorrir. Em seguida propôs-me um negócio, uma troca de serviços; ele me daria a moeda, eu lhe explicaria um ponto da lição de sintaxe. Não conseguira reter nada do livro, e estava com medo do pai. E concluía a proposta esfregando a pratinha nos joelhos...

Tive uma sensação esquisita. Não é que eu possuísse da virtude uma idéia antes própria de homem; não é também que não fosse fácil em empregar uma ou outra mentira de criança. Sabíamos ambos enganar ao mestre. A novidade estava nos termos da proposta, na troca de lição e dinheiro, compra franca, positiva, toma lá, dá cá; tal foi a causa da sensação. Fiquei a olhar para ele, à toa, sem poder dizer nada.

Compreende-se que o ponto da lição era difícil, e que o Raimundo, não o tendo aprendido, recorria a um meio que lhe pareceu útil para escapar ao castigo do pai. Se me tem pedido a coisa por favor, alcançá-la-ia do mesmo modo, como de outras vezes, mas parece que era lembrança das outras vezes, o medo de achar a minha vontade frouxa ou cansada, e não aprender como queria, - e pode ser mesmo que em alguma ocasião lhe tivesse ensinado mal, - parece que tal foi a causa da proposta. O pobre-diabo contava com o favor, - mas queria assegurar-lhe a eficácia, e daí recorreu à moeda que a mãe lhe dera e que ele guardava como relíquia ou brinquedo; pegou dela e veio esfregá-la nos joelhos, à minha vista, como uma tentação... Realmente, era bonita, fina, branca, muito branca; e para mim, que só trazia cobre no bolso, quando trazia alguma coisa, um cobre feio, grosso, azinhavrado...

Não queria recebê-la, e custava-me recusá-la. Olhei para o mestre, que continuava a ler, com tal interesse, que lhe pingava o rapé do nariz. - Ande, tome, dizia-me baixinho o filho. E a pratinha fuzilava-lhe entre os dedos, como se fora diamante... Em verdade, se o mestre não visse nada, que mal havia? E ele não podia ver nada, estava agarrado aos jornais, lendo com fogo, com indignação...

- Tome, tome...

Relancei os olhos pela sala, e dei com os do Curvelo em nós; disse ao Raimundo que esperasse. Pareceu-me que o outro nos observava, então dissimulei; mas daí a pouco deitei-lhe outra vez o olho, e - tanto se ilude a vontade! - não lhe vi mais nada. Então cobrei ânimo.

- Dê cá...

Raimundo deu-me a pratinha, sorrateiramente; eu meti-a na algibeira das calças, com um alvoroço que não posso definir. Cá estava ela comigo, pegadinha à perna. Restava prestar o serviço, ensinar a lição e não me demorei em fazê-lo, nem o fiz mal, ao menos conscientemente; passava-lhe a explicação em um retalho de papel que ele recebeu com cautela e cheio de atenção. Sentia-se que despendia um esforço cinco ou seis vezes maior para aprender um nada; mas contanto que ele escapasse ao castigo, tudo iria bem.

De repente, olhei para o Curvelo e estremeci; tinha os olhos em nós, com um riso que me pareceu mau. Disfarcei; mas daí a pouco, voltando-me outra vez para ele, achei-o do mesmo modo, com o mesmo ar, acrescendo que entrava a remexer-se no banco, impaciente. Sorri para ele e ele não sorriu; ao contrário, franziu a testa, o que lhe deu um aspecto ameaçador. O coração bateu-me muito.

Conto de Escola - Parte 02

- Seu Pilar, eu preciso falar com você, disse-me baixinho o filho do mestre.

Chamava-se Raimundo este pequeno, e era mole, aplicado, inteligência tarda. Raimundo gastava duas horas em reter aquilo que a outros levava apenas trinta ou cinqüenta minutos; vencia com o tempo o que não podia fazer logo com o cérebro. Reunia a isso um grande medo ao pai. Era uma criança fina, pálida, cara doente; raramente estava alegre. Entrava na escola depois do pai e retirava-se antes. O mestre era mais severo com ele do que conosco.

- O que é que você quer?

- Logo, respondeu ele com voz trêmula.

Começou a lição de escrita. Custa-me dizer que eu era dos mais adiantados da escola; mas era. Não digo também que era dos mais inteligentes, por um escrúpulo fácil de entender e de excelente efeito no estilo, mas não tenho outra convicção. Note-se que não era pálido nem mofino: tinha boas cores e músculos de ferro. Na lição de escrita, por exemplo, acabava sempre antes de todos, mas deixava-me estar a recortar narizes no papel ou na tábua, ocupação sem nobreza nem espiritualidade, mas em todo caso ingênua. Naquele dia foi a mesma coisa; tão depressa acabei, como entrei a reproduzir o nariz do mestre, dando-lhe cinco ou seis atitudes diferentes, das quais recordo a interrogativa, a admirativa, a dubitativa e a cogitativa. Não lhes punha esses nomes, pobre estudante de primeiras letras que era; mas, instintivamente, dava-lhes essas expressões. Os outros foram acabando; não tive remédio senão acabar também, entregar a escrita, e voltar para o meu lugar.

Com franqueza, estava arrependido de ter vindo. Agora que ficava preso, ardia por andar lá fora, e recapitulava o campo e o morro, pensava nos outros meninos vadios, o Chico Telha, o Américo, o Carlos das Escadinhas, a fina flor do bairro e do gênero humano. Para cúmulo de desespero, vi através das vidraças da escola, no claro azul do céu, por cima do morro do Livramento, um papagaio de papel, alto e largo, preso de uma corda imensa, que bojava no ar, uma coisa soberba. E eu na
escola, sentado, pernas unidas, com o livro de leitura e a gramática nos joelhos.

- Fui um bobo em vir, disse eu ao Raimundo.

- Não diga isso, murmurou ele.

Olhei para ele; estava mais pálido. Então lembrou-me outra vez que queria pedir-me alguma coisa, e perguntei-lhe o que era. Raimundo estremeceu de novo, e, rápido, disse-me que esperasse um pouco; era uma coisa particular.

- Seu Pilar... murmurou ele daí a alguns minutos.

- Que é?

- Você...

- Você quê?

Ele deitou os olhos ao pai, e depois a alguns outros meninos. Um destes, o Curvelo, olhava para ele, desconfiado, e o Raimundo, notando-me essa circunstância, pediu alguns minutos mais de espera. Confesso que começava a arder de curiosidade. Olhei para o Curvelo, e vi que parecia atento; podia ser uma simples curiosidade vaga, natural indiscrição; mas podia ser também alguma coisa entre eles. Esse Curvelo era um pouco levado do diabo. Tinha onze anos, era mais velho que nós.

Que me quereria o Raimundo? Continuei inquieto, remexendo-me muito, falando-lhe baixo, com instância, que me dissesse o que era, que ninguém cuidava dele nem de mim. Ou então, de tarde...

- De tarde, não, interrompeu-me ele; não pode ser de tarde.

- Então agora...

- Papai está olhando.

Na verdade, o mestre fitava-nos. Como era mais severo para o filho, buscava-o muitas vezes com os olhos, para trazê-lo mais aperreado. Mas nós também éramos finos; metemos o nariz no livro, e continuamos a ler. Afinal cansou e tomou as folhas do dia, três ou quatro, que ele lia devagar, mastigando as idéias e as paixões. Não esqueçam que estávamos então no fim da Regência, e que era grande a agitação pública. Policarpo tinha decerto algum partido, mas nunca pude averiguar esse ponto. O pior que ele podia ter, para nós, era a palmatória. E essa lá estava, pendurada do portal da janela, à direita, com os seus cinco olhos do diabo. Era só levantar a mão, despendurá-la e brandi-la, com a força do costume, que não era pouca. E daí, pode ser que alguma vez as paixões políticas dominassem nele a ponto de poupar-nos uma ou outra correção. Naquele dia, ao menos, pareceu-me que lia as folhas com muito interesse; levantava os olhos de quando em quando, ou tomava uma pitada, mas tornava logo aos jornais, e lia a valer.

No fim de algum tempo - dez ou doze minutos - Raimundo meteu a mão no bolso das calças e olhou para mim.

- Sabe o que tenho aqui?

- Não.

- Uma pratinha que mamãe me deu.

- Hoje?

- Não, no outro dia, quando fiz anos...

- Pratinha de verdade?

- De verdade.

Tirou-a vagarosamente, e mostrou-me de longe. Era uma moeda do tempo do rei, cuido que doze vinténs ou dois tostões, não me lembro; mas era uma moeda, e tal moeda que me fez pular o sangue no coração. Raimundo revolveu em mim o olhar pálido; depois perguntou-me se a queria para mim. Respondi-lhe que estava caçoando, mas ele jurou que não.

- Mas então você fica sem ela?

- Mamãe depois me arranja outra. Ela tem muitas que vovô lhe deixou, numa caixinha; algumas são de ouro. Você quer esta?

Conto de Escola - Parte 01

A escola era na Rua do Costa, um sobradinho de grade de pau. O ano era de 1840. Naquele dia - uma segunda-feira, do mês de maio - deixei-me estar alguns instantes na Rua da Princesa a ver onde iria brincar a manhã. Hesitava entre o morro de S. Diogo e o Campo de Sant'Ana, que não era então esse parque atual, construção de gentleman, mas um espaço rústico, mais ou menos infinito, alastrado de lavadeiras, capim e burros soltos. Morro ou campo? Tal era o problema. De repente disse comigo que o melhor era a escola. E guiei para a escola. Aqui vai a razão.

Na semana anterior tinha feito dois suetos, e, descoberto o caso, recebi o pagamento das mãos de meu pai, que me deu uma sova de vara de marmeleiro. As sovas de meu pai doíam por muito tempo. Era um velho empregado do Arsenal de Guerra, ríspido e intolerante. Sonhava para mim uma grande posição comercial, e tinha ânsia de me ver com os elementos mercantis, ler, escrever e contar, para me meter de caixeiro. Citava-me nomes de capitalistas que tinham começado ao balcão. Ora, foi a lembrança do último castigo que me levou naquela manhã para o colégio. Não era um menino de virtudes.

Subi a escada com cautela, para não ser ouvido do mestre, e cheguei a tempo; ele entrou na sala três ou quatro minutos depois. Entrou com o andar manso do costume, em chinelas de cordovão, com a jaqueta de brim lavada e desbotada, calça branca e tesa e grande colarinho caído. Chamava-se Policarpo e tinha perto de cinqüenta anos ou mais. Uma vez sentado, extraiu da jaqueta a boceta de rapé e o lenço vermelho, pô-los na gaveta; depois relanceou os olhos pela sala. Os meninos, que se conservaram de pé durante a entrada dele, tornaram a sentar-se. Tudo estava em ordem; começaram os trabalhos. 

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Sua biografia

Divertida biografia de Machado de Assis ao som da música "Machado de Assis" do cantor Martinho da Vila. O vídeo mostra fotos raras e cenas bem interessantes.